Verbete: Festa do Divino Espírito Santo

Por: Danilo José Zioni Ferretti e Bruna Inês Carelli Mendes

HISTÓRICO:


A festa do Divino Espírito Santo, em São João Del Rei, ocorria juntamente à do Bom Jesus de Matosinhos, em frente à igreja do mesmo nome, desde pelo menos 1783. Ao longo do século XIX, ela se consolidou como a mais popular da cidade, ocorrendo na data móvel de Pentecoste, entre maio e junho. Havia uma parte litúrgica, com sermões, novenas, missas e procissões. E havia também uma variedade de atividades lúdicas, como concertos de bandas, competições de argolinha, cavalhadas, barracas de comida, jogos de azar e, já no século XX, cinematógrafo. Nestas festividades, a população negra fazia-se presente como parte significativa dos fiéis, infundindo elementos de sua cultura pelo catolicismo popular, ainda que tais devoções não fossem especialmente voltadas aos africanos e seus descendentes. No entanto, apesar de toda a sua popularidade, a festa do Divino Espírito Santo foi extinta em 1924, por decisão do bispo de Mariana, em acordo com setores das elites sanjoanense e dos franciscanos holandeses que, desde 1904, difundiam um catolicismo ultramontano mais rigorista na cidade. As comemorações do Divino tornam-se um espaço mais fortemente marcado de significados para a coletividade negra de São João del Rei a partir do movimento de retomada da festa, no final dos anos 1990, historiado por Simone Assis.

Imperador do Divino e cortejo da Procissão de Santo Antônio em frente à Igreja do Rosário, São João del Rei, maio 2016. Foto: Danilo Ferretti.

Tal processo foi resultado da confluência entre diferentes agentes. Havia mulheres e homens negros que, desde os anos 1980, protagonizavam movimentos de valorização da cultura negra ou movimentos sociais ligados às Comunidades Eclesiais de Base e a Pastoral Afro-Brasileira em seus bairros periféricos.

Havia o novo pároco de Matosinhos, orientado pela teologia da libertação e aberto à maior participação dos paroquianos e ao ecumenismo. E havia intelectuais, em sua maioria brancos, voltados a valorizar as tradições culturais locais. O resultado foi a reinvenção da Festa do Divino, a partir de 1998, em que elementos da cultura negra receberam papel de destaque. Em 1999, foi inserida uma missa inculturada, com vários elementos da cultura afrobrasileira.

O Congado de Coronel Xavier Chaves acompanha a Procissão do Divino Espírito Santo, 27-5-2023. Foto: Danilo Ferretti.

Os congados da cidade passaram a ter na festa do Divino um de seus principais espaços de apresentação pública. No sábado, eles participam do cortejo da recriada procissão do Divino. No domingo, dia de Pentecoste, o auge da festa, realizam um grande encontro pela manhã com ternos de toda a cidade e região e ainda acompanham a procissão que se realiza após a missa solene. Como tradição reinventada, a nova festa do Divino do popular bairro do Matosinhos trazia forte marca de africanidade. A partir de 2011, com a substituição do pároco, houve um refluxo, com a supressão de algumas das práticas que valorizavam a cultura negra, como a missa inculturada, excluída a partir de 2014. Ainda hoje, no entanto, a presença marcante de ternos de congado nos festejos do Divino Espírito Santo confere a esta que é uma das mais populares festas da cidade um papel importante em afirmar a presença pública da cultura de matriz africana.

O Congado de Coronel Xavier Chaves acompanha a Procissão do Divino Espírito Santo, 27-5-2023. Foto: Danilo Ferretti.

Praça Sr. Bom Jesus Matosinhos | 389 | Matosinhos | São João del Rei, MG | 36305-142 | Brasil |


REFERÊNCIAS:


ADÃO, Kleber do Sacramento. “Devoções e diversões em São João del Rei: um estudo sobre as festas de Bom Jesus de Matosinhos” (1884-1924).” Tese, Doutorado em Educação Física, Faculdade de Educação Física da Unicamp; Campinas: 2001.


ASSIS, Simone. “A Festa do Divino Espírito Santo é coisa de raiz, é cultura’: batuques na paróquia do Matosinhos-São João del Rei/MG”. Dissertação (mestrado- Programa de Pós-graduação em HistóriaUFSJ), São João del Rei: 2021


HENRIQUES, José Cláudio. “O resgate da Festa do Divino do Bairro de Matosinhos” Revista do Instituto Histórico e Geográfico de São João del Rei, São João del Rei, vol IX, 2000.


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